Um mês depois do Pesadelo....

Faz hoje um mês que terminou, da pior maneira, o pior mês da minha vida... (e terminou com este momento)

Faz hoje um dia desde que a Nova Zelândia deixou de ter qualquer caso de Covid-19 no país, depois de 17 dias sem nenhum caso novo.

É uma sensação agridoce...

Neste último mês, principalmente no início, acabei por viver um conjunto de sentimentos que são difíceis de pôr em palavras.

Achei curioso ler sobre as várias fases do luto e de como, em alguns lugares, estas fases são representadas de uma forma tão perfeita. A minha experiência ficou mais bem representada nesta imagem da direita.


É sobretudo um sensação agridoce porque o Covid-19 foi exactamente a razão pela qual eu perdi o meu Pai... Sinto que no país onde estou se venceu realmente uma primeira batalha desta guerra. Ainda vão faltar muitas batalhas, é certo, mas sinto que eu ao fim da primeira batalha com sucesso daqui, eu já experienciei uma das piores derrotas possíveis.

Ontem, quando foi anunciado que a Nova Zelândia ia mudar para o Nível de Alerta 1, o mais baixo que o país tem, estava a ouvir o vídeo no Youtube. Quando este acabou, automaticamente "saltou" para um outro vídeo que acabei por deixar estar por não estar completamente focado no Youtube.

O vídeo foi este:

E este é o vídeo pelo qual escrevo esta mensagem...

A nossa experiência, minha e da minha família, com o Covid-19 foi exactamente igual a esta, embora com um final (apenas ligeiramente) diferente. É uma experiência completamente diferente de tudo que nos é descrito na televisão e em tudo que se lê, até se começar a ler os detalhes todos sobre a doença (e acreditem que eu li, ao ponto de muitas vezes parar por me doer).

O meu Pai, apesar de completamente saudável até começar a manifestar os sintomas, já estava na casa dos 80, mas esta é uma experiência absolutamente igual na casa dos 50 (por isso não é apenas idade).

Desde a entrada no hospital sem nada fazer querer que seria o Covid-19, até a evolução a entrar nos cuidados intensivos, a passar pelos avanços e retrocessos diários nas noticias vindas do hospital. O saber quais os orgãos afectados (e já era tanta coisa) e saber nas consequências a longo prazo, e as possíveis implicações (mesmo sem se saber quais serão realmente).

O número diários falam em recuperados e óbitos... mas nunca falam no tudo que há pelo meio.

Apesar do desfecho no caso do meu Pai, só tenho opinião positiva de tudo que veio do Hospital em Portugal e saiu com a sensação que se fez tudo que se podia. Os médicos e enfermeiros dos sistema de saúde de Portugal, com todos os seus sacrifícios, conseguiram dar resposta, embora fosse uma luta desigual.

Quando falo do triste desfecho que a minha família teve, a pessoas aqui na Nova Zelândia, acabo sempre por salientar que o nosso sistema de saúde não colapsou, que a doença é mesmo assim em alguns.  Mas digo para as pessoas também para perceberem a sorte que tem de estar aqui e de poder, depois do lockdown voltar para os seus pais.

Portugal esteve bem, quando comparado com Reino Unido, Itália, Espanha, etc... mas, muito infelizmente para mim, ainda está longe do que aconteceu na Nova Zelândia.

Estou a escrever porque depois de ouvir aquela entrevista em que alguém partilhou uma experiência tão TÃO  TÃO similar faz-me pensar que são milhares de pessoas a viver o mesmo pela mesma razão, e que, de uma forma ou de outra, ter menos uma pessoa afectada pode significar um impacto em muito menos vidas.

Hoje faleceram 7 pessoas em Portugal devido a este vírus. É provável que algumas tenham sido infectadas depois de o meu Pai nos ter deixado. Por isso queria escrever algo mais para tentar chegar a uma pessoa mais que fosse, para não ter um comportamento de risco.

Muita da raiva que senti (ali nas fases do luto cima), precisamente na fase da raiva, foi a injustiça pois o meu pai sempre teve todos os cuidados e mais alguns para não ser infectado e por isso parece-me sempre tão injusto. (aos poucos esta raiva desapareceu... para já pelo menos).

Sei que ainda há muita gente que não tem cuidados, e de alguma forma escrevo para partilharem com os país, avós ou amigos que dizem que isto só acontece a alguém distante, ou a alguém que não tem cuidado ou os velhinhos que já tem muitas doenças...
Até já ouvi que pessoas não acreditam que isto seja nada (isto no trabalho, e enchi-me de raiva por dentro mas não disse nada, porque me estavam a contar na terceira pessoa).

Depois de um mês em que estive muito mais só, sem ter com quem partilhar as muitas novidades das netas. Depois de não ter ninguém a quem ligar a perguntar como é que os Andrades (como sempre nos referíamos ao nosso FC Porto quando fazia asneiras) foram perder um jogo quando por instinto foi a minha primeira sensação ligar ao meu pai. Quando não tive com quem conversar sobre o que estava a acontecer nos Estados Unidos da América e de perguntar como isso estava a ser visto em Portugal. E não pode falar sobre a minha última mensagem e perguntar ao meu Pai o que tinha achado dela.

Este último mês foi um que ainda acordei muitas vezes ansioso a olhar para o telemóvel para ver se tinha notícias do hospital, apesar dessa fase já ter acontecido um mês antes, mas também um mês que aos poucos se vai recuperando e voltando a ter normalidade da vida, mesmo que esta normalidade seja diferente para sempre.
E tenha encontrado aos poucos outras coisas em que nos temos de focar. No meu caso a minha mãe e todas as mulheres na minha casa (inclusive a mais pequena que mesmo sem falar já resmunga)...

Mas acima de tudo com a certeza que há momentos bons que nunca se vão esquecer...
E que temos de aproveitar todos os momentos que temos nesta vida...

Para terminar esta mensagem fica uma foto de mais um desses momentos, desta vez na Nova Zelândia...



p.s.: faltou ainda um OBRIGADO muito grande por todas as mensagens que recebi. Não consegui responder a tudo mas li todas algumas vezes, e de facto foram mesmo muito boas e importantes para mim ler... De novo obrigado...

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