Nova Zelândia: Uma estranha normalidade...
Já lá vão mais de dois meses desde que escrevi aqui no blog. Já lá vai um mês desde que não abro o Facebook ou outras redes sociais, à excepção das que uso para fins profissionais (provavelmente vou abrir agora uma vez agora para partilhar este post para mais gente o poder ver)...
Muitas coisas mudam em dois meses, mas para mim o mais estranho é a nossa vida aos poucos regressa a uma normalidade que no mundo não é normal.
A semana passada tive uma "reunião online" com alumni da FEUP (Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto) que estão espalhados por diversos países do mundo. Claro que o assunto principal acabou por ser a pandemia, e todos partilharam a sua situação actual e falaram de todas as limitações que tem.
O estranho é que, quer eu, quer o colega que estava em Singapura não partilhávamos a maior parte (se não nenhuma) das experiência de todos os outros países, inclusive Portugal.
Na realidade a única limitação que temos actualmente é não podermos viajar para fora do país... ou melhor, nós agora já podemos sair, mas o regresso fica extremamente caro e inconveniente. Se sairmos do país e quisermos voltar, temos de pagar a nossa quarentena de 15 dias num hotel controlado pelo exército (custo de mais de 3000$) e fazer essa quarentena sem sair do hotel. Ainda tem que se fazer testes com resultados negativos pelo menos a data certas (3º e 12º dias). E isto só é permitido para quem tenha ou a cidadania ou seja residente permanente, senão tem que haver um pedido em regime de excepção, como por exemplo alguém com capacidade para fazer algo que não haja ninguém no país que consiga e seja essencial para a economia do país. Da última vez que vi 90% dos pedidos tinha sido rejeitados. São mesmo situações excepcionais.
Excluindo isso a vida prossegue com uma estranha normalidade. Na ilha onde vivemos não existe nenhum caso na comunidade há mais de 4 meses. Os únicos casos registados são pessoas que vem do estrangeiro e são apanhados durante a quarentena, e por isso ficam mais tempo na quarentena.
Na Ilha Norte, depois do maior lockdown, já houve dois surtos comunidade: um de origem desconhecida, há dois meses, que foi controlado em Auckland com outro lockdown de duas semanas; e um segundo que se conhece que esteve origem num funcionário de manutenção de navios carga onde teve contacto com a tripulação do barco e de alguma forma ficou infectado.
Esta normalidade parece-me cada vez mais difícil de explicar ao resto do mundo.
Os estádios estão cheios, os pubs estão cheios à noite, há festivais "cheios" de gente (bem, tanta gente quanto havia antes, pelo menos). A Catarina cantou numa sala de concerto a semana passada, com mais de 2000 pessoas a assistir. Já fiz voos internos, turísticos e a trabalho sem problema. Abaixo algumas fotos que tirei nas últimas semanas.
Sim, vêem-se máscaras na rua, mas são incrivelmente raras. Há avisos e estações de limpar as mãos em todo lado. Todas as portas de estabelecimentos públicos... TODAS... tem avisos e o código para quem quiser marcar na sua aplicação que lá estiveram.
Algumas coisas mudam: os parques de campismo para as férias de Verão (daqui a um mês e meio) já estão todos cheios... afinal ninguém vai poder sair do país. Como as pessoas não viajam para fora, usam o dinheiro para fazer renovações nas casas (por isso fica complicado arranjar alguém que faça trabalhos nas casas sem meses de esperas).
Para mim é uma sensação muito estranha. O vírus afectou a minha vida de uma das piores formas possíveis, e no entanto, tudo continua normal à minha volta. Enquanto isso, sei que o resto do mundo está ainda mais estranho.
De quase todas as formas possíveis agradeço esta normalidade que para já conseguimos ter para nós e para as nossas pequenas. Da segurança que nos transmite. Que me deixa ir trabalhar para o escritório se quiser (embora isso agora seja super flexível). O único problema é não poder estar com a nossa família. Percebemos que este é um dos preços que temos de pagar para esta normalidade mas custa na mesma.
Acho que o país de certa forma também agradece a normalidade que temos, e isso viu-se nas eleições, onde pela primeira vez na sua história, o Labour Party (partido que está no poder, e que o resto do mundo conhece por ser liderado pela Jacinda Ardern) ganhou com maioria absoluta. Não sou a favor de maiorias absolutas num governo (em nenhum) mas aqui percebi (e concordo) com o que esta votação quis dizer... Foi um apoio a uma das melhores respostas do mundo à pandemia (embora o governo não seja perfeito). Mesmo muitos que votaram na oposição apoiavam esta resposta.
Ainda assim acho que é difícil estar aqui e perceber o que está a acontecer no resto do mundo. Mesmo. Eu leio todos os dias as notícias de Portugal, falo com amigos a família em Portugal, fui afectado... e mesmo assim ainda me custa imaginar o resto do mundo nesta "normalidade". O resta das pessoas ainda percebem menos...
Afinal o país também não está excelente, longe disso... a falta de turistas (num país onde uma das maiores indústrias é o turismo) causa muitos problemas. Os nossos "lockdowns" foram muito mais agressivos que aqueles em Portugal, por exemplo, e sempre que há indício do virus voltar em algum sitio sabemos que vamos imediatamente entrar num novo lockdown (como aconteceu em Auckland), por isso num país em que nos últimos anos já tivemos de tudo (desde atentados terroristas, vulcões a explodir, terramotos, etc) os problemas psicológicos na população continuam a surgir. As coisas que vem de fora, com todos os controlos nas fronteiras, são muito mais lentos. E para além disso... não sabemos quanto tempo mais isto tudo vai durar, e se vamos continuar sempre bem ou se vamos ser atingidos por uma outra onda.
Na verdade, se o virus entra no país como entrou nos países europeus, o sistema de saúde é muito frágil e não vai estar preparado para lidar com isso.
Resumindo, o mundo está estranho. E o nosso país, por estar perto daquilo que era a normalidade antigamente, ainda mais estranho é... e o futuro é um grande ponto de interrogação.
Eu hoje estou particularmente feliz. Depois de amanhã vou poder ir tomar o pequeno-almoço fora e comprar algo numa loja, algo que não podia fazer há 12 semanas!!!!!! Claro que ainda não posso sair de um raio de 25km, muito menos viajar para Portugal. Tb não sei quando vou poder receber os meus pais cá, sendo que o rebento nasce em Janeiro....acho que mais depressa vou poder ir visitar-vos :)
ResponderEliminarVocês já sabem que são sempre bem vindos aqui... Ou isso ou vamos nós vos visitar aí... porque se só abrirmos as fronteiras convosco não vão haver muitas outras opções.
EliminarRealmente andamos com uma extrema normalidade. Sendo que cá por terras lusas acredito que teremos uns meses muito difíceis. Com o mau tempo a pandemia piora e a falta de sol e os longos meses de contenção vão fazer significativas mossas nas pessoas. A resistência mental provavelmente vai falhar.
EliminarAlém disso a questão económica vai ser problemática mas nem vale a pena ir por aí.
Resta tentar fazer o melhor a beber dos exemplos mais luminosos!
Boa sorte Rui que ainda me vou lembrando de ti muitas vezes!!