Deixar aos poucos de ser Português...



Nada começar o ano com uma das frustrações para o anos futuros: continuar com um passaporte Português válido ou não?

Antes de entrar em detalhes nesta dúvida, vou começar a explicar a todos aqueles que estando em Portugal não se apercebem do quão ridículas as burocracias Portuguesas são, partilhando algumas das nossas experiências. Por fim, vou mostrar como o governo Português nos abandonou completamente na Nova Zelândia (de forma intencional ou por incompetência) e o quão complicado vai ser manter aqui um passaporte válido sem gastar uma fortuna (e em alguns casos nem assim).

Sempre que é preciso renovar um passaporte Português é necessário ter também um Cartão de Cidadão válido. Em alternativa é necessário ter um BI (dos antigos) válido. 

Há mais de 4 anos, quando a Sofia nasceu, começamos uma das maiores sagas burocráticas da nossa vida. Isto foi descrito em vários posts deste blog: Ida a Wellington, ida Auckland para ter finalmente um passaporte. Foram praticamente 6 meses, mais de 2000$ (sim, dois mil dólares), tudo para primeiro conseguir primeiro um documento de vindo de Sydney, depois um BI válido que precisava de um bebé presencialmente em Wellington para recolher impressões digitais e depois uma viagem a Auckland para finalmente, ao fim de alguma espera, ter o passaporte.

No meio de toda a frustração descrita nos posts acima, os únicos pontos positivos foram mesmo os cônsules honorários (ou seja, não pagos) Daniel Silva (que ainda agora tenta sempre minimizar que o impacto que todas estas burocracias tem nos Portugueses oferecendo por vezes até boleia até ao aeroporto para os que não são da ilha) e Ivan McNicholl (entretanto já deixou de ser consul e que na altura entendia o ridículo que era pedir impressões digitais de um bebé e entrou em contacto com as autoridades Portuguesas para tentar evitar a viagem com o bebé, o que foi rejeitado - note-se que no final o que ficou foi um borrão de tinta no lugar da impressão digital porque... era um bebé e não se consegui recolher nada mesmo presencialmente).

Essa foi a história que mais nos custou (financeiramente e que causou mais frustrações) mas houve diversas. Outra caricata aconteceu em Portugal há dois anos, na nossa última visita:
Para poupar os voos para Auckland (que já de si são caros) aproveitamos a visita a Portugal para renovar os cartões de cidadão. Detalhe burocrático importante, os códigos são sempre enviados para a morada fiscal, e a nossa é na Nova Zelândia. Ou seja, apesar de estarmos fisicamente em Portugal (na loja de cidadão do Porto, para ser mais preciso) não podíamos levantar o cartão sem primeiro ir à Nova Zelândia levantar a carta ou pedir uma emissão para Lisboa (que é o centro do universo Português) e ir levantar o cartão em Lisboa (obviamente presencial). O momento alto foi a naturalidade que nos diziam que era "só ir levantar a carta à Nova Zelândia".  Temos representante fiscal em Portugal e pedimos parar a carta ser enviada para essa morada mas mesmo isso não é possível. Acabamos por resolver a situação tendo um amigo que tinha a nossa chave de casa na Nova Zelândia, levantar a carta e enviar para Portugal enquanto ainda lá estávamos (o que vale tratar de tudo com tempo).

Ainda assim, independentemente de todas as frustrações, até havia um certo grau de compreensão nas nossas viagens: afinal não estamos na ilha principal da Nova Zelândia, tudo acontece na Ilha Norte (onde está a capital Wellington e a maior cidade e com maior número de Portugueses, Auckland). Os voos entre ilhas até são mais ou menos fáceis (é um autocarro com asas e com muita ginástica ainda se vão conseguindo alguns voos económicos). O Daniel Silva (cônsul em Auckland) faz de tudo para nos ajudar com alguma flexibilidade dos seus horários (visto ele próprio ter a sua vida profissional). Por isso até agora fomos "aguentando" com um "tem que ser". Apesar de alguns pedidos (tipo a recolha de impressões digitais de um bebé de um mês) nunca fazer sentido.

O "NOVO" PROBLEMA

Só que agora o governo Português resolveu inventar mais um pouco e basicamente manter o passaporte Português torna-se uma tarefa quase impossível (já para não falar nos custos ridículos):

Desde o último mês Dezembro de 2018, o consulado (honorário) Português na Nova Zelândia já não pode emitir Bilhetes de Identidade (ou cartão de cidadão, o que nunca o fez - ver mais à frente no texto). Agora só pode emitir passaportes, o que para um residente no país quer dizer se o Cartão de Cidadão ou BI expirar tem de sair do pais para renovar o Cartão de Cidadão. Neste momento o local mais próximo da Nova Zelândia onde se pode fazer esta renovação é Sydney. Para aqueles que acham que a Nova Zelândia e Austrália são o mesmo país: NÃO SÃO... Ir da nossa cidade a Sydney é o mesmo que ir do Porto à Polónia. Em tempos de voo, e mais ainda em termos de preços. Claro que se tem de fazer a viagem em horário de trabalho, logo também temos de tirar dias de férias para fazer a viagem (ao contrário do que conseguimos fazer mais facilmente para Auckland).

Um pouco incrédulos como nós, alguns Portugueses contactaram a embaixada de Sydney (visto o cônsul nos ter dito que não podia fazer nada) e a resposta que obtiveram foi:


Olhando para situação que vivemos com a Sofia entrávamos num paradoxo... a Sofia quando nasceu só tinha nacionalidade Portuguesa, não podia viajar para a Austrália sem ter um passaporte, que era possível em Auckland, mas para isso precisava primeiro ir à Austrália (para onde não podia viajar sem um passaporte). Imagino que para isso fosse preciso um requerimento ou outro documento para fazer a viagem que nem sei como poderia obter.

Agora o que mais me choca nesta falta de consideração (por parte do governo Português) para todos os Portugueses na Nova Zelândia é que a máquina que está em Auckland com o cônsul honorário para emitir passaportes é EXACTAMENTE A MESMA que emite Cartões de Cidadão, mas a cônsul que está autorizado a usar a máquina para emitir os passaportes, não está autorizado, pelo governo Português, a emitir Cartões de Cidadão. Como se estes, por alguma razão, requeressem mais segurança que um passaporte (que ao contrário do Cartão de Cidadão é reconhecido por todos os países do mundo).

E é aqui que para mim está a visão cega da burocracia Portuguesa... que tanto quer mostrar ser moderna que fica mais atrasada que os países civilizados, forçando um cidadão Português que quer manter esta cidadania viva a pagar milhares de dólares para o fazer.

2019, o ano que agora começa, traz a mim e à minha família a hipótese de ter a cidadania Neo-Zelandesa, e com isto o passaporte preto com o feto prateado. Sempre fui um orgulhoso Português e Europeu e sempre me imaginei a viajar com este passaporte.
A Nova Zelândia é um país de coração que gostaria de ter nacionalidade mas nunca a vi como uma substituição para o passaporte Português. Agora se a alternativa para manter o meu passaporte Português válido é gastar milhares de dólares para suportar um sistema burocrático obsoleto, poderá bem ser o principio do fim de renovar este passaporte. Pelo menos por diversos períodos de tempo.

Curiosamente para renovar o Passaporte da Nova Zelândia tudo que é preciso é ir online e o passaporte é enviado para casa. Ahh... e não há Cartão do Cidadão ou BI... a carta de condução ou cartão de estudante serve como documento identificativo.

Toda esta situação vai ter ainda mais impacto para aqueles que não vão ter as mesmas alternativas que nós na renovação de passaportes... ainda mais que sem um passaporte válido não se pode ter um visto válido, logo não se pode estar legal no país...

E é assim ser emigrante Português na Nova Zelândia...


P.S. IMPORTANTE: depois de partilhar este post fui informado que está confirmado que o consulado honorário de Auckland vai fechar completamente em Junho. Ou seja, até para tirar os passaportes vai ser preciso ir a Sydney. Não sei aqui se por decisão do Ministerio ou se porque o cônsul honorário, estando cansado destas decisões, ter optado por rescindir da posição (o que seria perfeitamente compreensível). Ou seja, para renovar os passaportes vai passar a ser necessário voar duas vezes para a Austrália...

Comentários

  1. Infelizmente, algo a que ja estamos habituados, mas nao deviamos estar. Vivo na NZ com a minha familia (filha Portuguesa, esposa AUS/NZ) e passamos pelo mesmo circo absolutamente ridiculo.

    ResponderEliminar
  2. Eu tive exatamente os mesmos problemas, por meses e meses, e tambem tive que ir a Auckland para fazer o meu passaporte, custo a preco dum voo de Wellington a Auckland por o dia, vivo na Kapiti Coast portanto de carro a Wellington (1 hora e meia de carro no trafico), custo de ter o car parked no aeroporto. Depois a minha mae faleceu o ano passado, paguei para arranjar a certidao de obito para o Consulado de Sydney, disseram que contactavam Portugal e parar a pensao dela, nao fizeram nada ate hoje. Ja estou farta disto tudo, e este ano vou ficar Neo Zelandesa, e mais facil. Ha outras coisas que tenham que fazer mas estou farta da maneira que somos tratados.

    ResponderEliminar
  3. Caro Rui. Eu ja vivo na Nova Zelandia a 25 anos . As suas palavras descrevem a minha experiencia, embora eu esteja um pouco em vantagem porque a minha esposa e Neo Zelandesa. Eu viajo com passaporte Neo Zelandes porque tenho difficuldade em manter os meus documentos portugueses actualizados. Tambem acho caricato que embora tenha um mestrado em enfermagem e tenha exercido na Nova Zelandia, na Australia e Reino Unido, nao possa trabalhar em Portugal um Pais que me viu nascer e que servi na Marinha Portuguesa.

    ResponderEliminar
  4. Enquanto Português acho lamentável ler todas estas palavras (incluindo a dos comentários). Como cidadão Português sinto-me no dever de vos ajudar. Existe alguma forma de vos conseguir ajudar? Eu modo no "centro do universo Português" chamado Lisboa - o que é outro lamento, pois o país tem mais cidades. Diga-me, de que maneira o consigo ajudar? Com quem poderei falar para chamar à atenção deste problema, se ainda persiste? À moda do bom Português, por vezes é preciso falar com as pessoas cara a cara e explicar-lhes, talvez até fanzendo um desenho, para resolver estes problemas.

    Vocês são Portugueses. Nós pertencemos a um país de descobrimentos. Não faz absolutamente sentido ficarem esquecidos. Não interessa são são 100, 10 ou 1 Português. Tem de existir um procedimento alternativo que satisfaça inteiramente as vossas necessidades. É obrigação do nosso estado satisfazer estas necessidades. Servirá para vós e servirá para todos os restantes portugueses espalhados pelo mundo. Caso possa ajudar, entrem em contacto comigo.

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares